O ser humano se compara com os demais e a conclusão dessa comparação lhe afeta rapidamente. Quando sente que é melhor do que o outro, ele se engrandece, se sente bem, com mais valor e sua autoestima também se eleva. Contudo, se ele conclui o inverso, sente-se menor, inferior, desprezado, envergonhado e sua autoestima é reduzida. Por conta da vergonha, fica acuado e, neste momento, tenta fugir dessa situação ao se afastar da ameaça, a pessoa que ele acredita ser mais importante do que ele, ou luta contra a ameaça.
Essa reação de luta ou fuga é uma reação instintiva usada para a sobrevivência (corporal). Contudo, é a que possuímos e a usamos em todos os nossos âmbitos, não apenas na parte física. Por isso lutamos com tudo e todos com quem nos sentimos ameaçados ou fugimos. Sejam ideias, posições sociais, emoções ou em qualquer outra parte de nossas vidas, a nossa reação a tudo é a mesma que usamos para a sobrevivência física.
No caso da ameaça física, algo visível e facilmente compreendido, agimos de forma a evitar ferimentos, lesões ou a morte. Somos violentos para acabar com a ameaça ou rápidos para fugir dela. Este cenário é visível pela própria imaginação. No entanto, agimos assim para todo o resto de nossas vidas.
Se o ferimento é a lesão do corpo físico gerando dor e rompendo a integridade deste, o ferimento emocional é tudo que afeta negativamente a nossa sensação emocional rompendo com o bem-estar emocional que, análogo ao corpo físico, possui a sua integridade.
A integridade nada mais é do que o bem-estar geral. Assim, o bem-estar físico é o resultado de sua integridade e bom funcionamento. O mesmo acontece com nossas ideias: quando acreditamos nelas e ficamos bem com isso, temos o nosso “corpo mental” íntegro. Contudo, quando alguém ameaça a este ou rompe a sua integridade ao demonstrar que tais ideias não estão corretas ou não são reais ou quando alguém prova que tais ideias não são verdadeiras ou verossímeis, a pessoa sente insegurança, sente ser ameaçada e, assim como luta por sua vida física ou foge para evitar um confronto prejudicial, fazemos o mesmo: nós fugimos do assunto ou tentamos atacar aquele que acreditamos ser a ameaça.
O ser humano é muito dependente do sistema visual e as emoções são invisíveis. Então, quando nos sentimos mal, nós identificamos o momento em que o mal-estar aparece e comparamos com a mudança ambiental sofrida. Assim, quando o mal-estar surge quando alguém diz alguma coisa ou age de alguma forma, concluímos que foi esta pessoa que nos gerou mal-estar identificando a ameaça. Logo, buscamos a fuga ou o término da ameaça. Isso significa que não importa como a pessoa nos “atacou”, só importa quem foi e, assim, direcionamos a nossa violência e agressividade a ela para acabar com a ameaça.
É por conta disso que as pessoas misturam muito os campos de suas vidas. Ao receber um “ataque” intelectual com provas de que suas ideias não são boas ou não são reais, revidamos atacando outras partes da pessoa como a moralidade, o posto social, seus sentimentos e quaisquer outras formas que possamos atacá-la. É assim que misturamos ideias com opiniões, opiniões com sentimentos, sentimentos com pensamentos e pensamentos com ações. É assim que, quando alguém diz algo que não gostamos, sentimos que o nosso campo emocional é rompido e, para evitar um novo “ataque” nós atacamos primeiro com humilhações e até com agressões físicas.
As humilhações nada mais são do que ataques emocionais ao outro na tentativa de reprimi-lo ou de reduzir a sua importância porque, quando não tem importância, seus “ataques” são igualmente irrelevantes.
Como a nossa autoestima é o conjunto do nosso próprio julgamento com o julgamento que os outros têm sobre nós, somos diretamente afetados por opiniões alheias. Quanto mais valorizamos as opiniões alheias, mais dependentes dos demais ficamos e, se eles não nos veem como desejamos sermos vistos, usamos de técnicas para nos sentir mais importantes como a humilhação aos outros, uma técnica muito recorrente.
De forma sutil, clara, indireta, agressiva ou com um olhar, conseguimos valorizar ou desprezar os outros e, após isso, nos comparamos a eles e concluímos sermos melhores ou piores, ou seja, a nossa autoestima aumenta ou diminui.
Quanto mais certeza temos sobre o que julgamos saber, mais confiante ficamos e, quanto mais sucesso temos, maior é a nossa autoconfiança. Temos a sensação de certeza o que nos gera sensação de segurança, uma sensação de suma importância e que os nossos instintos buscam sempre. Queremos segurança contra insetos, contra a fome, contra a sede, contra tudo que nos incomoda incluindo segurança financeira, emocional, intelectual… Queremos a certeza de que tudo o que sabemos, fazemos e sentimos está correto e sempre que sentimos alguma desconfiança, tentamos apagar essa insegurança. É essa insegurança a ameaça que sentimos e contra o que lutamos. Por isso buscamos pessoas que compartilham das mesmas ideias, dos mesmos ideais, dos mesmos sentimentos… Queremos ficar com pessoas que sejam como nós porque ouvi-las falar sobre o que já concordamos reforça as nossas próprias ideias nos gerando segurança. Já o oposto também é verdadeiro: quando alguém mostra que há falhas em nossas ideias, que não sabemos tudo, que tudo em que acreditamos não está correto, sentimos insegurança. Insegurança sobre nós mesmos, sobre o que pensamos, sobre como entendemos o mundo, sobre o que sentimos e isso é aterrorizador para a maioria das pessoas. Então para evitar tal sensação, tentamos eliminar o que acreditamos ser a ameaça.
Quem não consegue provar suas ideias e é questionado sente insegurança, ou seja, ameaça. A pessoa se sente acuada, envergonhada e inferiorizada pelo simples fato de não conseguir conquistar os demais. Já quando o seu discurso é bem-visto por outras pessoas, ela se sente mais confiante visto que há mais pessoas que concordam com ela porque acreditamos que o pensamento padrão (da maioria) é o certo.
Assim, quando a pessoa se sente acuada, sem saída e sem provas de que suas ideias estão corretas, ela revida tentando fazer com que o outro se sinta acuado, inferiorizado, desvalorizado, acuado e com medo. A lógica é “se não consigo vencer no campo do debate, saio dele” junto de “se não consigo provar que sou melhor, então tento provar que o outro é pior” e “se não consigo me aumentar para me ver como melhor, eu diminuo o outro para, por comparação, me sentir melhor que ele.”
Essa estrutura de pensamento é tão humana que agimos assim sem perceber e compreendemos os outros exatamente por pensarmos da mesma maneira. É a empatia em que entendemos o outro por já ter sentido e pensado o mesmo que ele.