O ser humano, mais especificamente os brasileiros, buscam alguém que realize os seus desejos, saciando as suas carências. Alegam que desejam o amor por acreditarem que quem ama satisfaz o outro e impõem suas vontades sobre os outros para satisfazer-se por terceiros.
É comum ouvirmos “você não me ama porque não faz o que eu quero” ou “se me amasse faria isso (o que eu quero)” demonstrando a crença de que amar seja sinônimo de vontade de fazer pelo ou para os outros. Também é comum impormos as nossas vontades sobre os outros porque são “certas” e, por estarem “certas” os demais devem obedecer e seguir, sendo um dos motivos pelo qual brigamos para mostrar quem está certo visando ganhar esta briga.
Quantas pessoas falam “estude porque eu não tive oportunidade”, “não desperdice comida porque há quem não tenha o que comer”, “faça medicina porque era o meu sonho e não pude realizar”, “faça um bom casamento porque o meu não deu certo”, “aprenda inglês porque eu não aprendi” e frases similares. A base dessas frases é a mesma ideia: faça o que eu quis e não fiz.
Embora a frase se foque em satisfazer terceiros, o que é visto como altruísta, é este terceiro que alega, ou seja, é uma pessoa que exige que outra a satisfaça. Há algo mais egoísta que isso?
Ademais, quando terceiros fazem o que nós desejamos fazer nós não sentimos a satisfação. Portanto, é uma técnica que não gera o resultado esperado, já que fazer o filho estudar não fará o pai mais culto bem como fazer uma pessoa raspar o prato de comida não diminuirá a fome de outra pessoa. Analisando bem esta percepção de forçar os outros a fazerem o que nós desejamos ter feito podemos concluir que chega a ser insano, uma vez que não há lógica em alcançar o resultado.
A questão é que desejamos ter em nossas vidas os objetos de nossos desejos, nem que seja em parte. Se não estudamos medicina apesar de desejarmos, então buscaremos ter a medicina em nossas vidas, ainda que através de um parente. Isso nos satisfaz em parte porque sentimos que temos responsabilidade e contribuição para este resultado, o que nos alegra. É uma forma de controle e o controle nos dá prazer, satisfação, segurança e tranquilidade.
Já no caso de terceiros serem outras pessoas em vez da discursante, o objetivo é se impor. Quando o outro o acata a sensação de poder aumenta bem como a de certeza sobre a sua imposição, afinal, se o outro acatou é porque concordou. Isso fortalece a crença sobre a ideia imposta aumentando a sensação de segurança (certeza) e autoconfiança.
Interessante perceber que aqueles que aceitam essas ideias são quem alimentam este sistema, já que farão o que não querem, deixando de realizar os seus sonhos, e provavelmente agirão da mesma forma sobre os outros por estarem frustrados em não fazerem o que desejam. Assim o oprimido (que é coagido a satisfazer o outro) se torna o opressor (impõem-se sobre outros) ao longo do tempo e esse sistema é retroalimentado, mantendo a sua existência. As exceções não são suficiente para manter esse sistema em larga escala a ponto de ser cultural.