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A liberdade está na mente

Uma forma muito comum de relacionamento é baseada em alianças e favores. Pessoas se unem para derrotar inimigos comuns e fazer algo pelo outro significa que o outro está obrigado a este, ou seja, deve um favor.

Este tipo de pensamento é baseado na percepção de incapacidade pessoal da pessoa, motivo pelo qual busca ajuda, e na convicção da troca de favores, sendo que um deve ao outro necessariamente.

A partir disso a pessoa imagina que o outro lhe deve um favor quando lhe presta um favor. Ademais acredita que o outro tenha o dever de lhe saciar, seja de forma direta (ao pedir o favor) ou indireta (sem pedir o favor). Uma pessoa que se considera boa acredita que segue todas as regras e leis sociais, fazendo o favor de obedecê-las. Então, quando deseja algo que não consegue por si cobra o favor de algo ou alguém, normalmente uma entidade governamental sem que haja uma pessoa diretamente. Para compreender o motivo disso veja o link sobre culpar entidades abstratas.

Para quem enxerga o mundo com pessoas livres, onde todos fazem escolhas e criam as suas vidas, a percepção de dívida não existe. Essa pessoa não ajuda ninguém para exigir favor posteriormente tampouco aceita exigência ou pedido de ajuda de outrem como maneira de pagamento por um favor recebido. Assim como esta pessoa não faz nada para pedir um favor em troca, ela também acredita que quem a ajude escolhe ajudá-la e, então, não existe motivo para pagar (retribuir o favor).

A percepção de liberdade vai além: ela é livre para escolher conforme acredita ser melhor e isso não é apenas para si, mas para todos. Então se alguém a prejudicar ela entenderá que foi escolha da pessoa. Isso significa que o outro não agiu para causar um prejuízo a ela, para obter alguma satisfação. Ademais, perceber que as pessoas podem escolher como desejam impede a criação de raiva, mágoa ou ódio.

Visto que ela enxerga a liberdade das pessoas, se vitimizar e culpar alguém por sua insatisfação não lhe é uma opção. Então exigir que governo ou estado resolvam o seu problema está fora de cogitação de sua mente. Assim como as pessoas escolhem o que acreditam ser melhor para elas mesmas, os governos e estados, que são pessoas, fazem o mesmo.

Essa pessoa percebe que cada um usa a liberdade como deseja, inclusive para crimes, delitos ou contravenções, estas últimas que são comuns no cotidiano da população. Então ser alvo de algum prejuízo feito por outro não gera nenhum sentimento de raiva para com aquele que o fez. Ela percebe que o outro usou de sua liberdade e capacidade para cometer a ação e ela não reagiu melhor por falta da própria incapacidade. Caso ela fosse melhor que o outro ela teria mais benefícios e o venceria, não recebendo o prejuízo. Ela não tem mágoa, raiva ou ódio por ninguém.

Já quem segue a primeira linha de raciocínio, onde todos estão enrolados e dependentes uns dos outros, a frustração por não conseguir se impor ao outro gera a mágoa, raiva e ódio do outro não ter se submetido. Como todos dependem de todos não existe liberdade: todos possuem algo a dever, a exigir ou a temer daqueles que fazem parte do seu círculo de amizade e relacionamento.

A dependência faz a pessoa tentar controlar aquele que a satisfaz para tê-lo e usá-lo para se satisfazer sempre que desejar. Por isso há briga para se impor sobre os outros e a consequência desse pensamento é, se a imposição é o desejo e a vitória, então a submissão é a vergonha e a derrota. Quando a pessoa possui vitória se sente confiante e bem, porém quando perde essa briga ela senta raiva daquele que “tomou” a sua vitória de se impor.

Para os libertos não existe briga para se impor. Se impor e se submeter são singelas características da vida, principalmente social. Essa pessoa não é vítima da chuva, como se a natureza se impusesse sobre ela através da chuva, nem mesmo de uma doença. Ela não pensa sobre isso, mas sobre as possibilidades de resolver o que a incomoda. Livre para pedir ajuda e não receber, livre para recusar ajudar, livre das amarras de relacionamentos de trocas de favores (no sentido de fazer um favor é fazer o outro ficar endividado), esta pessoa não cria sentimentos negativos ou incômodos sobre mais ninguém por não responsabilizar ninguém por suas amarguras. Afinal, se todos podem fazer o que desejam, ninguém possui o dever ou responsabilidade de saciá-lo.

Esse pensamento não é apenas libertador por impedir a criação de sentimentos que nos aprisionam, mas mostram a percepção da pessoa sobre o mundo. Ela entende que é um indivíduo no mundo, sem que nada nem ninguém tenha de lhe servir bem como a si mesmo. O outro pensamento advém da crença de que alguém tenha o dever de nos saciar, que somos o centro do mundo e o dever dos demais seja nos fazer feliz satisfazendo as nossas vontades. Neste modo de pensar a pessoa acredita que, se alguém não lhe serve, é descartável ou inimigo, uma vez que pode tentar “roubar” a sua posição de centro do mundo e ter os demais aos seus pés para lhe satisfazer. Isso geraria uma competição para ter “servos” ao seus dispor e, assim, essa pessoa é uma rival ou inimiga. A maneira mais eficiente de reduzir a concorrência é acabar com ela, ou seja, com esse “rival” que é percebido como inimigo. Então, para quem pensa assim, existem dois tipos de pessoas: quem se submete às suas vontades, que estão a seu favor, ou quem não se submete e, por isso, é um potencial inimigo, logo está contra. Não existe uma percepção de que o outro seja simplesmente outra pessoa que tenha vontades e faça escolhas para si. O pensamento é: se não está comigo, escolhendo o que eu considero bom ou certo (para mim), então está contra mim, agindo contra mim e para me prejudicar.

Acreditar que as pessoas são potenciais inimigos faz a pessoa viver atenta e com alerta em tempo integral por conta do medo de ser prejudicado, medo de não ter pessoas para lhe servir/satisfazer, medo de que alguém ganhe mais atenção, medo de não ser perfeito (condição importante para cativar as pessoas e convencê-las a lhe servir)… A vida é baseada no medo, sensação que aprisiona uma pessoa. Por conta do medo a pessoa não sente que escolhe o que faz porque acredita que não há como fazer diferente porque fazer diferente significa que pode ser prejudicada por outro.

A pessoa vive presa no medo por conta da sua percepção sobre o mundo e sobre as pessoas. O medo de não ter o controle sobre os outros as aprisiona a tal ponto que muitas vezes não conseguem acreditar que existe a opção de viverem livres (sem medo), consciente de suas escolhas e com controle sobre essas.

O medo faz a pessoa buscar apoio social, pois que é a sua forma de ter pessoas para realizar as suas vontades. Quanto maior o medo, maior é o seu apelo e carisma para atrair pessoa à sua “causa”.

A liberdade está na mente, não na quantidade de dinheiro, roupas, apartamentos, viagens, famílias… enquanto acreditar que existe uma briga pelo “poder” (capacidade de se impor), a pessoa manter-se-á refém da busca pelo poder. Como não tem como vencer sempre, inevitavelmente perderá e, então, sentir-se-á perdedora e com raiva, fazendo-a se sentir mal, configurando a sensação de prisão (desejar algo e não tê-lo).

Acreditar que os outros tenham o dever de nos saciar também nos aprisiona, pois quem não concordar com essa ideia (todos discordam) não aceitará a submissão de bom grado, o que gera conflito. Além disso a pessoa pode não se submeter, o que também gerará insatisfação. Se uma pessoa acredita que os demais devem se submeter às suas vontades, provavelmente muitas outras também acreditarão nisso. Então várias pessoas pensam que os outros devem se servir e a lutar para provar e conseguir essa posição acontece.

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